O mundo despede-se de Jorge Mario Bergoglio, o primeiro Papa jesuíta, sul-americano e não europeu, que revolucionou a Igreja Católica com humildade, coragem e um sorriso inesquecível. Tinha 88 anos.
Faleceu esta segunda-feira o Papa Francisco, aos 88 anos, após semanas de agravamento do seu já longo historial de problemas respiratórios. Chefe da Igreja Católica desde 2013, Jorge Mario Bergoglio ficará para sempre lembrado como o “Papa dos pobres” — um Sumo Pontífice que quebrou tradições, lançou debates antes impensáveis no seio da Santa Sé e trouxe um novo rosto à Igreja: mais humano, mais direto e mais próximo das pessoas.
A eleição de Francisco a 13 de março de 2013 marcou uma mudança de era. O fumo branco na Capela Sistina anunciou ao mundo não só um novo Papa, mas uma nova postura eclesial: vinha aí o primeiro Papa jesuíta, o primeiro latino-americano e o primeiro não europeu em mais de 1200 anos. Ao adotar o nome Francisco, evocando São Francisco de Assis, declarou logo ao mundo a sua intenção de se aproximar dos mais pobres, dos esquecidos, dos marginais.
De Buenos Aires ao mundo
Nascido em Buenos Aires, em 1936, filho de imigrantes italianos, Francisco entrou na Companhia de Jesus aos 22 anos e foi ordenado sacerdote em 1969. Apaixonado pelo futebol e pelo tango, foi também professor de literatura, psicologia e teologia antes de ser nomeado arcebispo de Buenos Aires e, mais tarde, cardeal.
No Vaticano, ganhou notoriedade pela sua vida simples, a aversão ao luxo e a defesa intransigente da justiça social. Como Papa, nunca se deixou moldar pelas formas rígidas da Cúria Romana: recusou sapatos vermelhos, preferiu viver na Casa Santa Marta em vez do Palácio Apostólico e chegou a andar num Ford Focus em vez do tradicional papamóvel blindado.
Um Papa fora do protocolo
Francisco surpreendeu o mundo com declarações sobre temas antes considerados tabus dentro da Igreja: criticou duramente os abusos sexuais no clero, pediu desculpas às vítimas e reformou os mecanismos de responsabilização dos bispos; falou abertamente sobre o direito dos homossexuais a formar famílias; posicionou-se contra a eutanásia e reiterou que o aborto “nunca é uma solução”.
Num gesto inédito, afirmou numa conversa com jovens que “o sexo é uma das coisas belas que Deus deu ao ser humano”, e em entrevistas emocionantes mostrou uma capacidade rara de escuta e empatia. Foi igualmente crítico da indiferença social, do capitalismo selvagem, das guerras e da crise climática, tornando-se uma voz moral com ressonância global.
Portugal no coração
Portugal teve uma relação especial com Francisco. Em 2017 visitou Fátima por ocasião do centenário das aparições e, em 2023, voltou para presidir à Jornada Mundial da Juventude em Lisboa — o maior evento católico desde a pandemia. Apesar da fragilidade física, marcou presença com discursos fortes, gestos espontâneos e encontros além do protocolo. A imagem do Papa, em cadeira de rodas, a sorrir para multidões de jovens, ficará como símbolo de um pastor incansável.
Um adeus com dignidade
Os últimos meses do Papa foram marcados por problemas de saúde agravados. Depois de várias infeções respiratórias, esteve internado por 38 dias no início deste ano. O Vaticano falou de uma situação “complexa” e o próprio Francisco terá admitido estar próximo do fim.
Morre agora o Papa que não teve medo de dizer “não sei”, que preferiu a escuta à condenação, que trouxe o Evangelho para a vida real. Morre o homem que quis uma Igreja em saída, “como um hospital de campanha”, aberta ao mundo e à dor do outro.
O Papa do sorriso rasgado partiu — mas a marca que deixou na história da Igreja e no coração dos fiéis não desaparecerá tão cedo.